Pergunta:
Como Tolkien convenceu Lewis da existência de Deus? Cite seus argumentos.
Resposta:
J.R.R. Tolkien foi essencial para a conversão de C.S. Lewis ao cristianismo, principalmente durante uma conversa marcante em setembro de 1931. Na época, Lewis era um ateu que se via cada vez mais intrigado com questões espirituais e a fé, enquanto Tolkien, um católico devoto, acreditava que a mitologia e as histórias que ambos amavam poderiam apontar para verdades mais profundas.
Aqui estão alguns dos argumentos que Tolkien apresentou a Lewis:
1. Mitologia como reflexo da Verdade: Tolkien argumentou que os mitos – incluindo as histórias que eles mesmos criavam – poderiam ser "ecos" ou "sombras" de uma verdade maior. Para ele, as narrativas míticas, com seus temas de sacrifício, redenção e heroísmo, refletem anseios profundos da humanidade por algo além deste mundo. Tolkien sugeriu que essas histórias apontavam para o que ele chamava de "mito verdadeiro" – a história de Cristo – que, diferente dos mitos, realmente aconteceu.
2. Cristianismo como "mito verdadeiro": Tolkien explicou que o cristianismo é, em essência, o "mito que se tornou real", onde Deus entrou na história humana de forma única. Ele acreditava que os evangelhos continham uma verdade histórica e que a figura de Jesus cumpria simbolicamente os temas universais dos mitos antigos, mas em um evento real. Essa ideia atraiu Lewis, que já era fascinado por mitos e, embora cético, percebeu que talvez estivesse descartando a ideia de Deus devido ao seu próprio orgulho intelectual.
3. O papel da imaginação e da razão: Tolkien usou o conceito de que Deus poderia alcançar o coração humano por meio da imaginação, antes mesmo de tocar a razão. Ele sustentava que a imaginação é uma das vias pelas quais as pessoas captam a verdade – mesmo antes de a entenderem racionalmente. Assim, Lewis começou a ver o cristianismo como algo que não apenas fazia sentido lógico, mas também completava e satisfazia seus anseios interiores por beleza, justiça e significado.
Esses argumentos tocaram profundamente Lewis e, posteriormente, o levaram a uma conversão ao cristianismo, embora ele tenha optado pelo anglicanismo. A partir dessa conversa, ambos permaneceram amigos e continuaram a explorar temas cristãos e mitológicos em suas obras, influenciando mutuamente suas visões de mundo e suas criações literárias.
Pergunta:
Quais os argumentos posteriores de Lewis para justificar sua crença?
Resposta:
Após sua conversão ao cristianismo, C.S. Lewis se tornou um apologista influente, desenvolvendo argumentos em defesa da fé cristã. Em seus escritos, ele abordou tanto questões racionais quanto emocionais, buscando responder dúvidas que ele mesmo teve no passado. Seus principais argumentos incluem:
1. O Argumento Moral: Em Mero Cristianismo, Lewis argumenta que todos os seres humanos parecem ter uma noção universal de certo e errado, um "sentido moral" que transcende culturas. Ele acreditava que essa moralidade não poderia ter surgido apenas de convenções sociais, pois reflete uma "Lei Moral" que aponta para um Legislador – ou seja, Deus. Para ele, a presença dessa moralidade universal era uma evidência de que Deus existia e era a fonte dessa Lei.
2. O Argumento do Desejo: Lewis também desenvolveu o "Argumento do Desejo" em obras como O Problema do Sofrimento. Ele observou que os seres humanos têm desejos profundos que nada no mundo consegue satisfazer completamente. Para Lewis, essa insatisfação era uma pista de que fomos feitos para algo além deste mundo – ou seja, para uma realidade divina. Esse anseio, ou "saudade" por algo transcendente, ele via como um sinal de que Deus existe e de que fomos criados para uma relação com Ele.
3. Cristo como Senhor, Mentiroso ou Lunático: Também em Mero Cristianismo, Lewis formulou o famoso "trilema" sobre a identidade de Jesus. Ele argumentou que, ao alegar ser o Filho de Deus, Jesus só poderia ser um mentiroso, um lunático ou realmente o Senhor. Lewis considerava que Jesus não tinha perfil de mentiroso nem de lunático, então, a opção mais plausível seria que Ele estava dizendo a verdade – ou seja, Ele é o Senhor.
4. A Razão e a Fé: Em Milagres, Lewis argumenta que a própria capacidade humana de raciocinar aponta para algo além do materialismo. Ele sugeriu que, se o mundo fosse puramente material, nossos pensamentos seriam apenas produtos de processos físicos e não haveria razão para confiar na lógica ou na verdade. Para ele, a existência da razão indicava uma fonte sobrenatural – um Deus racional que criou mentes capazes de compreender a verdade.
5. O Problema do Sofrimento e do Mal: Em O Problema do Sofrimento e A Grief Observed (depois da morte de sua esposa), Lewis abordou como o sofrimento não contradiz a existência de um Deus bom, mas pode ter um papel na formação do caráter humano e no crescimento espiritual. Ele acreditava que, embora o mal e a dor sejam reais, eles não são incompatíveis com a bondade de Deus, mas são parte de um mundo onde o livre-arbítrio permite o desenvolvimento de um amor autêntico e de virtudes.
Esses argumentos, para Lewis, não eram apenas ideias teóricas, mas respostas às perguntas e dificuldades que ele mesmo enfrentou. Ele os considerava uma maneira de apontar para uma fé que é tanto racional quanto profunda, respondendo ao anseio humano por significado e verdade.
Pergunta:
Quando Tolkien confrontou Lewis com a existência de Deus, Lewis a princípio não acreditou. Posteriormente, após finalmente acreditar, ainda assim bateu o pé com alguns temas, como Jesus ser o filho de Deus. Ao fim de tudo, Lewis cedeu aos argumentos e passou a acreditar ao todo. Já ouvi um termo que deram a ele de "o mais relutante dos convertidos". Creio que ele deva ter sido polêmico, até mesmo em suas obras, vide a famosa As Crônicas de Nárnia, unindo mitologia, cotidiano e temas bíblicos.
Resposta:
Sim, C.S. Lewis é conhecido como "o mais relutante dos convertidos", um título que ele mesmo usou para descrever sua jornada espiritual. Ele foi cético até os últimos estágios e, mesmo após aceitar a existência de Deus, resistiu a aceitar a figura de Cristo como o Filho de Deus, achando isso especialmente difícil de conciliar com sua formação intelectual.
Lewis era cuidadoso ao explorar temas cristãos em suas obras, como em As Crônicas de Nárnia, onde misturou simbolismo cristão com mitologia greco-romana e nórdica, o que gerou algumas controvérsias. Por exemplo, a figura de Aslan como um leão que se sacrifica e ressuscita é uma referência clara a Jesus, mas ao lado de personagens mitológicos, como faunos, ninfas e o próprio Papai Noel. Essa abordagem única de Lewis trouxe críticas de alguns cristãos que viam a inclusão de seres mitológicos como potencialmente conflitante com as doutrinas cristãs, enquanto outros o viam como alguém que conseguia transmitir verdades cristãs de uma maneira acessível e imaginativa, especialmente para crianças.
Pergunta:
O que Lewis dizia de toda essa polêmica?
Resposta:
C.S. Lewis estava ciente das controvérsias sobre sua abordagem e as misturas de temas em suas obras, mas ele acreditava que estava oferecendo algo mais profundo e útil. Em relação às críticas sobre o uso de mitologia em As Crônicas de Nárnia, ele não via isso como uma contradição ao cristianismo, mas como uma maneira de tornar o evangelho e os temas cristãos mais compreensíveis e envolventes, especialmente para os jovens.
Para ele, a mitologia não era uma ameaça à fé, mas um recurso que refletia verdades universais, como Tolkien argumentara em suas conversas. Lewis acreditava que, ao conectar mitologia com a narrativa cristã, ele revelava que muitos dos temas e arquétipos presentes em várias culturas e mitologias apontavam para um mesmo anseio humano por redenção, sacrifício e virtude – temas centrais ao cristianismo.
Além disso, Lewis via a imaginação como uma ponte para alcançar o coração e a mente das pessoas. Ele acreditava que histórias com simbolismo cristão podiam ajudar os leitores a perceberem a beleza e a verdade do evangelho, de uma forma emocional e intuitiva, que talvez não se conseguisse só com argumentos teológicos. Em resposta à polêmica, ele chegou a dizer que a fé cristã podia "tornar o universo maior", e ele via Nárnia como um reflexo desse conceito: um mundo onde o sobrenatural e o cotidiano se entrelaçavam, como ele acreditava que acontecia no mundo real.
Em suma, Lewis estava menos preocupado com as polêmicas e mais interessado em criar histórias que falassem ao coração das pessoas, plantando sementes de fé e reflexão que elas talvez não encontrassem em outros lugares.