Unificação: O Blog do Lucas Cardozo e o Críticas do Lucas Cardozo agora são um só. O blog se tornou um espaço pessoal para rascunhos e afins, além de algumas publicações de alguns sites que já fiz parte.

09 janeiro 2019

[GEEKABLE] [CRÍTICA] Resident Evil 6 - O Capítulo Final

[Repostagem temporária de algumas críticas que publiquei no Geekable].
[Matéria de 2017]

Resident Evil 6 - O Capítulo Final

Depois de quase 15 anos, a franquia de filmes Resident Evil chega ao seu sexto e último longa. Inspirado nos jogos de mesmo nome da Capcom, os filmes sempre buscaram uma história própria, com uma protagonista exclusiva, algo que dividiu opiniões. Por parte dos críticos, a franquia nunca surpreendeu, mas por parte do público foi um sucesso. Já para os gamers, há quem se sentisse ofendido com a adaptação, enquanto outros considerassem apenas bons filmes de ação.

Com direção e roteiro de Paul W. S. Anderson, que roteirizou toda a franquia, não dirigindo apenas os segundo e terceiro filmes, O Capítulo Final chega a com a proposta de encerrar as aventuras de Alice no mundo pós-apocalíptico e responder a todas as perguntas deixadas nos filmes anteriores. Diferente do que aconteceu no quinto filme, que continuava exatamente de onde o quarto parou, no sexto a história avança no tempo, mostrando Alice (Milla Jovovich) lutando sozinha para sobreviver após ter sido traída por Albert Wesker (Shawn Roberts). Antes, porém, Alice conta a origem do t-vírus e o envolvimento da corporação Umbrella, responsável pelo fim do mundo, relembrando também a franquia de forma bem rasa. Continuando a trama, Alice descobre através da Rainha Vermelha (Ever Gabo Jovovich Anderson) que existe uma cura escondida no subsolo da Umbrella, mesmo local que se passa a história do primeiro filme. Após ser raptada pela Umbrella, ela foge em direção a Racoon City para seu objetivo.

As cenas de ação estão no nível dos longas anteriores, sempre empolgantes. Dessa vez ainda conta com armamentos pesados por parte da Umbrella. Com 48 horas para o extermínio total da humanidade, Alice corre contra o tempo, rendendo um filme dinâmico quase sem tempo para respirar, como se fosse uma longa e única cena de ação (parcialmente semelhante ao quinto filme nesse quesito). As cenas de luta, porém, se dividem, principalmente em relação aos zumbis e outros infectados, com uma edição grosseira e uma câmera tremida que não propõe visão total do inimigo nem dos movimentos. Para piorar, nos ambientes escuros chega a ser difícil enxergar o que está sendo mostrado. Já as cenas de suspense, algo que a franquia havia deixado de lado, retorna de forma bastante falha. O resultado é o mesmo de filmes de terror feitos apenas para assustar, com um incômodo efeito sonoro agudo para qualquer coisa que aconteça. Qualquer coisa mesmo. Chega a ser irritante e não transmite o clima desejado, ainda mais num filme de ação.

Aproveitando o gancho dos zumbis, o grande e único destaque vai para a horda da Umbrella, que chama a atenção em todas as cenas que aparece. De resto, o filme dá lugar a seres monstruosos aleatórios e nada marcantes. Aleatórios também são os novos personagens. Com respostas nada convincentes, o diretor disse em entrevistas que os outros morreram e que os novos foram inseridos para atrair público. O filme simplesmente insere tais personagens e não os desenvolve, sendo usados apenas a favor da protagonista. Trocar personagens já inseridos e desenvolvidos, alguns até vindo dos jogos, por outros exclusivos e inéditos totalmente aleatórios é o melhor a se fazer para atrair público? Certeza? Como se não bastasse, até mesmo alguns personagens antigos que retornaram foram deixados de lado, como a Claire (Ali Carter) e o próprio Wesker. Exatamente: O vilão é deixado de lado e sequer é aproveitado, estando presente apenas por estar. Quem ganha destaque é o Dr. Alexander Isaacs (Ian Glen). A mudança gera rumos interessantes, apesar de resgatarem o cansativo elemento de clonagens (que estava esquecida desde os filmes antigos), mas deixa um incômodo pelo fato da franquia não trabalhar seus personagens como deveria.

Felizmente, em meio aos clichês, o filme consegue apresentar algumas reviravoltas interessantes, resgatando tudo o que foi apresentado na franquia e usando ao seu favor, embora isso gere furos de roteiro em relação os filmes antigos que simplesmente ignoraram. O longa toma uma aparência nostálgica, mas com a pegada dos novos filmes. Os acontecimentos levam a um desfecho duvidoso para um último filme, porém aceitável. Conseguem encerrar todo um arco.

O 3D, diferente dos utilizados nos quarto e quinto filmes, não marca. Enquanto nos anteriores os efeitos podem ser considerados uns dos melhores já feitos (principalmente no quarto), aqui não há nada demais e o máximo de destaque na tela não vale a pena o ingresso mais caro. Quando um filme é lançado em 3D, ele deve fazer parte da experiência. A queda de qualidade é absurda. Mas deixando o efeito de lado, o filme em si está no mesmo nível dos anteriores. Talvez pior que alguns, talvez melhor que outros, a verdade é que a franquia nunca foi realmente boa, conquistando mais o grande público. Deixaram a desejar nesse suposto encerramento, mas cumpriram o que prometeram. O impacto que a franquia causou só o tempo dirá. Um reboot futuramente seria bom, com uma pegada mais puxada para os jogos. As animações comprovam.

[GEEKABLE] [CRÍTICA] Assassin's Creed

[Repostagem temporária de algumas críticas que publiquei no Geekable].
[Matéria de 2017]

Assassin's Creed

Em meio a tantos filmes ruins baseados em jogos, o executivo da Ubisoft havia dito numa entrevista que a adaptação de Assassin's Creed seria um divisor de águas, onde a empresa trabalharia junto ao estúdio de cinema responsável (no caso, a Fox) para uma adaptação literal, um marco na história de filmes da categoria. O resultado chegou e recebeu um desempenho negativo de críticas lá fora. Eis que finalmente chega ao Brasil e confirmo: Não é um divisor de águas. Está mais para divisor de público.

Primeiramente, Assassin's Creed passa longe da bomba que andam considerando, mas também não chega a ser grandioso. É aquele tipo de filme que consegue entreter, mas que dá uma sensação de que poderia ser melhor. Como filme, diverte. Como adaptação, não posso dizer com exatidão por não ter jogado os jogos, embora tenha visto vídeos, conheça a base da história e alguns elementos, mas após algumas pesquisas com críticos gamers notei que o filme pode sim ser considerado uma boa adaptação, apesar do resultado. É importante destacar que filmes baseados numa obra podem ser avaliados tanto como filme tanto quanto adaptação. O ideal é que seja funcional nos dois lados.

Diferente do que a maioria das adaptações seguem, o longa é baseado na franquia de jogos em vez de um jogo em específico, mas sua história se passa no mesmo universo. Ou seja, temos uma aventura inédita com um personagem exclusivo, mas com os mesmos elementos dos jogos, inclusive se encaixando na história geral. Na trama, Callum Lynch (Michael Fassbender) é mandado para a cadeira elétrica por assassinato, mas é salvo pela Drª Sophia Rikkin (Marion Cotillard), que trabalha para a fundação Abstergo, na Espanha. Ele descobre ser descendente de Aguillar, membro de uma organização secreta conhecida como Assassinos. Contra sua vontade, ele é posto na Animus, uma enorme máquina capaz de interligar a mente do usuário com seu ancestral. Callum então é transportado para o corpo de Aguillar, que viveu durante a Inquisição Espanhola do século XV. No passado, ele deve lutar contra os Templários, inimigos declarados, e encontrar a Maçã do Éden, um artefato possuidor do código genético do livre arbítrio. De acordo com a Drª Sophia, a Maçã é necessária para o objetivo da empresa, que é acabar com a violência do mundo.

As cenas que ocorrem no passado são visualmente incríveis, com figurino e cenários bastante característicos dos jogos. Também estão presentes as armas clássicas, como a adaga, e muitas acrobacias. Merece importância relatar que as cenas no passado são todas em espanhol, melhorando a experiência. Porém, se por um lado a franquia de jogos é conhecida por esses momentos de batalhas de séculos atrás, pelo filme o foco é o contrário: O presente. Com esse foco, o filme acaba por desenvolver melhor o ambiente em que as cobaias vivem e a situação do protagonista, mas também acaba por durar mais do que devia e desperdiçar tempo em assuntos já datados.

Apesar de apresentar uma nova história e inserir diversos elementos dos jogos, o longa sofre com a falta de aprofundamento. O público que não conhece os jogos irá entender a trama, mas ficará sem entender alguns detalhes. Por parte do filme, os personagens são superficiais. Estão onde estão, cumprem seus papéis e nada mais. Não que seja realmente um problema, mas deixa vago as reais intenções de cada um. Não dá ao público o apego de identificação, tornando-os esquecíveis. Por parte dos jogos, temos a Maçã do Éden, um artefato poderoso que sequer é explorado na trama, apenas inserido, mesmo sendo uma peça-chave na história. O Salto da Fé, que os assassinos usam para pular de grandes alturas, sequer é explicado, sendo apenas inserido também.

Com enorme potencial desperdiçado, mas com um resultado aceitável, Assassin's Creed se molda nos padrões hollywoodianos, com direito a clichês, e se torna mais um filme baseado num jogo, dessa vez superior a muitos da categoria, mas ainda assim com a sensação de que precisam melhorar. Problemas a parte, o produto final agrada com boas cenas e uma apresentação de uma história que pode ser mais explorada em suas continuações, caso tenha. A ideia de personagens exclusivos para o cinema pode ser de grande ajuda, evitando assim comparações detalhadas por parte do público mais exigente, expandindo a franquia com um universo canônico e deixando uma liberdade maior para criar uma história dentro do mesmo universo sem afetar o que já foi contado.

[GEEKABLE] [CRÍTICA] Eu Fico Loko

[Repostagem temporária de algumas críticas que publiquei no Geekable].
[Matéria de 2017]

Eu Fico Loko

Com a situação atual da internet e dos jovens alienados, ser youtuber atualmente virou gerador de ódio apenas pelo fato de ser youtuber, o que explica a grande divisão de público entre os que querem e os que não querem assistir ao filme, seja por ser fã, por achar a trama bacana ou simplesmente por odiar. Com uma proposta de contar a história de Christian Figueiredo, vlogueiro de grande sucesso atualmente, o filme Eu Fico Loko, que também é nome do seu canal e dos livros biográficos lançados por ele dos quais o filme se baseou, acaba se tornando uma história sobre um adolescente típico da atualidade, só que esse faz vídeos para o YouTube. A trama mais parece um filme americano adolescente. E não são os filmes inspirados na realidade? Pois bem.

O filme se divide entre uma introdução e encerramento na atualidade, um curto momento no começo com o Christian criança e o foco e grande parte que é sua adolescência. No longa, Christian (Filipe Bragança) é o famoso "loser" na escola, o cara que ninguém se importa, o perdedor que todos implicam. Para ser aceito, ele começa a se envolver nas besteiras dos amigos, mas só piora a situação, como na cena da mistura com bebida alcoólica. Cria situações para fugir de um suposto problema bobo, mas acaba piorando mais ainda, como na cena sobre ele já ter beijado uma garota apenas para dizer que não é "bv", onde inventa a Gabriela (Giovanna Brigio) e seu amigo descobre que ela existe. Ele é apaixonado por Alice (Isabella Moreira), uma garota da sua sala, mas tem vergonha de chamá-la para sair. Ignorado até na educação física, Christian grava curtas para a internet junto com seu amigo Yan (José Victor Pires), só para depois ser zoado na escola e sofrer bullying por pessoas como Mauro (Michel Joelsas). Fora do ambiente escolar, Christian recebe cuidado de sua mãe (Alessandra Negrini), seu pai (Marcello Airoldi) e, principalmente, recebe conselhos de sua avó (Suely Franco), que sempre diz para mandar todos irem à m... (rs). A avó de Christian tem um destaque especial na trama e diverte em todas as cenas que aparece.

Questões como aceitação, namoro e primeira vez são tratados no longa de forma eficiente. É como um diário de adolescente adaptado para filme, relatando problemas considerados comuns para a época. E por ser uma trama comum, acaba se aproximando mais ainda de seu público jovem, independente de ser fã ou não do Christian. O filme ainda conta com elenco juvenil relativamente famoso, trazendo atores de produções infanto-juvenis da tv brasileira, como Chiquititas, Carrossel, Malhação e Rebeldes. A direção e o roteiro ficaram por conta de Bruno Garotti e a produção por Júlio Uchôa.

Nos créditos finais são passadas algumas cenas dos vídeos que geraram as histórias contadas nos filmes (os vídeos por sua vez geraram os livros). Como alguém que já acompanhou seu canal no passado, esperava ver mais casos adaptados, mas nem por isso torna o filme inferior, já que tudo o que é mostrado é importante para o que irá acontecer a seguir, não se resumindo a casos isolados, mas sim a um acontecimento que irá repercutir. O que senti falta mesmo foram de mais cenas de suas gravações. Pouco explorado, temos pequenos momentos dele gravando os curtas. Em relação ao vlog, faz sentido ter menos ainda, já que o filme é justamente toda a história que o levou a criar o canal. Um possível vacilo talvez tenha sido numa pequena cena em seu final que na hora não percebi. Quando notei, senti confuso. Tem a ver com o destino de uma personagem. Mas relevem, não atrapalha a trama.

Longe de ser um clássico, que sequer é a proposta, Eu Fico Loko visa entreter e contar a trajetória de um garoto considerado fracassado que decidiu gravar seus desabafos e postar na internet. Mesmo com o fundo se assemelhando a diversos adolescentes, ele ainda possuía o diferencial de criatividade, criando curtas para a internet, em vez de ficar sem fazer nada e reclamando de quem tenta ser diferente, como muitos fazem. Injustiçado pelos haters, o longa acaba se tornando subestimado por ser "uma biografia de um youtuber de 20 anos", mesmo que seu resultado seja parcialmente positivo. Christian viu uma oportunidade de aproveitar seu cotidiano e relatar sua história, que pode servir de inspiração para muitos jovens. Não é nenhum grande gênio digno de Nobel da paz, é apenas um jovem aproveitando a vida e que quer trazer alegria para as pessoas, fazendo com que elas se identifiquem com seus casos. A ironia disso tudo é que o próprio Christian, que também participa do longa, sabe que é exagero ele ter três biografias e um filme. Ele entende toda a situação. Essa fama quem deu a ele foram os fãs, claro. E ele aproveitou.

[GEEKABLE] [CRÍTICA] Ainda Existiremos?

[Repostagem temporária de algumas críticas que publiquei no Geekable].
[Matéria de 2016]

Ainda Existiremos?

Documentário incrível da National Geographic sobre conscientização ecológica. Leonardo DiCaprio faz um ótimo trabalho viajando o mundo e mostrando a situação da Terra. É o tema visto de forma humana, política e econômica. Cidade, floresta, recife, calota polar, seja na terra, no ar, no mar, onde for, o documentário abrange o mundo e literalmente o planeta em si. A direção é de Fisher Stevens, com Martin Scorsese como produtor executivo.

Como disse, DiCaprio, que além de ator é ativista do meio ambiente, mensageiro da paz e embaixador da ONU, viaja pelo mundo provando que a Terra está sofrendo com nosso consumo. Ele também entrevista diversas pessoas ao longo da viagem, como profissionais da área, professores, políticos e até mesmo figuras famosas como o presidente Barack Obama e o papa Francisco.

O documentário não se prende apenas em dados e estatísticas. Ele mostra a realidade, os locais afetados, cita exemplos, faz comparações, se utiliza de recursos gráficos, prova que estamos destruindo o planeta. Também mostra como o governo atrapalha a luta pela salvação da Terra, como o comércio de combustíveis fósseis prejudica ainda mais essa luta, como aqueles que tentam conscientizar não são levados a sério (incluindo aí o próprio DiCaprio), etc. Cita nomes, pessoas, marcas, empresas. Não só, como também acusa ligações entre alguns políticos e as empresas, denunciando uma rede de corrupção, além da manipulação midiática que insiste em dizer que o aquecimento global é a maior mentira da história.

Em alguns pontos acompanhamos a saga de DiCaprio na ONU, passando por situações como as críticas que ele recebeu no início apenas por ser ator, seus discursos empolgantes, os eventos oficiais que participou, encontro com presidente, as conferências ambientais, etc, além de citar levemente a produção do filme O Regresso, que, num momento em especial, citam o problema que a produção enfrentou no set devido ao aquecimento global, que derreteu o gelo do ambiente, necessário para a filmagem, e obrigou a equipe a se deslocar para outro país, que mesmo assim também estava sofrendo com o derretimento.

Um tema tratado é a questão dos povos, cidades, países que estão sendo afetados devido as mudanças climáticas. Mortes, refugiados, pobreza, recuamento da população, territórios sumindo do mapa, imigração, revoltas, protestos, falta de recursos básicos, um verdadeiro caos. A ironia é que, mesmo se parássemos de poluir agora mesmo, a natureza levaria muito tempo para se estabilizar. Mas estabilizaria. Ou seja, alguns povos já estão confinados, suas terras irão desaparecer e ninguém pode fazer nada. Outros se apegam a esperança de que o mundo perceba o que fizeram com a natureza e acordem antes que tudo suma.

Além de todo o alerta, o documentário também insere soluções, debates, formas de salvar o mundo, por mais que pareça ser tarde demais, pois não é. Não completamente. Esses momentos em parte felizes mostram o que já fizemos, o que podemos fazer, avanços tecnológicos, investimentos, tudo para resolver a situação. E, claro, mostram também atitudes temporárias realizadas para resistir enquanto o mundo não se decide. É como se alguns lugares ganhassem um prazo adicional, uma chance de tentar se consertar. Chance essa que outros lugares não conseguiram nem conseguirão. Soluções como redução de consumo, mudança alimentar, troca de combustível, imposto de carbono, energia solar, entre outros, são discutidos no documentário. Infelizmente a incerteza de que os líderes mundiais irão tomar medidas drásticas antes que seja tarde demais para a humanidade continua.

[GEEKABLE] [CRÍTICA] Festa da Salsicha

[Repostagem temporária de algumas críticas que publiquei no Geekable].
[Matéria de 2016]

Festa da Salsicha

Festa da Salsicha ultrapassa os limites da insanidade e não sabe quando parar, gerando um resultado promissor, porém duvidoso. Comédia e drama se misturam numa aventura tão viajada que nos faz indagar sobre a existência do longa. Para a crítica, devo me adequar ao estilo do filme, mas sem me rebaixar ao seu nível. Drogas pra que se essa animação mostra muito bem as consequências disso? Acredite: O trailer não prepara para o que está por vir. Nem um pouco.

Foram anos para que a animação fosse aprovada pela Sony. Desde South Park não tivemos uma animação adulta com tanto investimento e estreando em grande escala. A demora não foi a toa, já que estamos tratando de algo polêmico e de alta classificação. Uma coisa é fazer um filme besteirol, outra é uma animação, que por si só possui seu público reduzido devido a preconceitos de que "é coisa de criança" (imaginem as crianças vendo isso, os pais teriam um infarto).

O principal responsável pela animação foi ninguém menos que o polêmico Seth Rogen. Foi uma grande equipe dedicada a construir esta obra inesperada, dentre eles Evan Goldberg. Os envolvidos foram os mesmos responsáveis por filmes como Superbad, É o Fim e A Entrevista.

Prometido como uma espécie de paródia aos filmes Disney/Pixar, inclusive com algumas referências, o longa consegue ser interessante ao dar vida aos alimentos, inserindo também críticas a assuntos como preconceito e religião, mas ao mesmo tempo se perde em querer impor piadas de duplo sentido a todo momento. Se você espera um grande debate filosófico sobre as crenças que nos impedem de fazermos coisas que queremos, prepare-se para, ao invés disso, ouvir a cada cena alguma piada sobre a salsicha querendo entrar gostoso no pão ou encostar a pontinha. Depois não diga que eu não avisei.

Com roteiro adaptado pelo Porta das Fundos, a versão brasileira do filme é competente ao entregar piadas que façam sentido para nós brasileiros. Por um lado é ótimo, mas por outro perde os diversos trocadilhos que o longa proporciona.

Os primeiros minutos já demonstram o nível da animação através de uma apresentação musical bizarramente empolgante com diversos produtos do mercado, principalmente alimentos, onde todos cantam sobre os deuses (no caso, nós humanos, a não ser que você que esteja lendo não seja um, daí ignore esse comentário). A maioria canta alegre, querendo que os deuses os levem para o "Paraíso", mas alguns poucos sabem da verdade e cantam assustados querendo continuar no mercado.

O grupo principal de personagens é formado pelo salsicha Frank, pela pão Brenda, pelo lavash árabe Kareem e pelo bagel judeu Sammy. O vilão completamente desnecessário da trama é o Ducha, que dispensa comentários para que minha mente guarde o resto da sanidade que me sobrou. Durante a ida para o paraíso, um acidente fatal ocorre quando o carrinho de compras tomba. A maioria dos sobreviventes são levados pela deusa do carrinho, mas esses citados acabam ficando presos no mercado. Como estão fora da embalagem, sabem que serão descartados. O Ducha acaba sendo jogado fora e decide se vingar de Frank. E pensar que Frank e Brenda só queriam ter relações...

Em determinado momento, Frank descobre que tudo aquilo é uma mentira, que o paraíso não existe e que os alimentos são criados para puro consumo dos deuses. Disposto a acabar com aquilo, ele tenta avisar a todos, mas é ignorado. É dentro desse contexto que o filme se aproveita para as críticas religiosas, usando preconceito e ignorância que no final se converte numa moral de respeito ao próximo. Talvez não exatamente do jeito que deveria ser, mas o ideal é válido. Uma das críticas, já citada anteriormente, é a da existência de regras supostamente divinas que impedem os seres de satisfazerem seus desejos. Obviamente estão tratando do desejo carnal, mas o sentido é válido para tudo.

Com o tempo, a trama se divide entre o grupo principal e os alimentos que foram para o falso paraíso. Mesmo assim, a animação dura mais que o necessário, arranjando tempo para inserir todas as piadas toscas possíveis, do nível de mente maldosa de adolescente da quinta série.

O humor bastante duvidoso vai além, muito mais sacana e explícito que qualquer filme do tipo, se aproveitando do fato de ser uma animação para representar seu besteirol num nível intenso. É utilizado um humor negro pesado, politicamente incorreto, altamente ácido e por vezes preconceituoso, se utilizando fortemente de estereótipos, duplos sentidos e situações duvidosas.

O tipo de humor utilizado é algo que vem sendo debatido desde muitos anos. Não posso criticar aqueles que riem das piadas, por mais imbecis que sejam, afinal, esse foi o objetivo, ser escrachado mesmo, polêmico. Porém, ressalvas devem ser feitas. Para isso, citarei dois casos.

O primeiro é em relação a piadas envolvendo coisas sérias como abuso ou algo do tipo, como na cena de estupro simulado onde o Ducha chupa uma caixa de suco que está vazando pela região de baixo enquanto a caixa morre pedindo por ajuda. Mesmo que sejam seres 'inanimados', não consigo de jeito nenhum ver algo engraçado nessa situação. Diferente de mim, percebi que praticamente todos que estavam presentes na mesma sessão que a minha riram. E riram muito.

O segundo caso é semelhante, mas envolvem grupos específicos. A ideia do humor negro é criticar, tocar na ferida, e isso o filme faz com religiões. Dentre elas, a relação conflituosa entre judeus e árabes é bem retratada e é visível que tudo aquilo é irônico. Como disse, uma moral com bons ensinamentos surge ao final, mas certo acontecimento que ocorre depois se torna uma grande heresia para tais grupos, fazendo-os ignorar tudo o que foi construído até ali. Alguns conseguiram entender a mensagem, mas outros só verão ofensas.

Não é minha intenção ser o chato e nem estou de mimimi. O humor deve ser estudado e é a melhor forma de quebrar tabus, sendo ousado e fazendo o que muitos não tem coragem de fazer, ironizando aquilo que muitos insistem em não ver. Porém vivemos numa sociedade com noções pré-programadas do que é aceitável ou não, e tais noções nos ditam até onde podemos ir. Se é para passar dos limites, que seja por um ideal de melhoria social, de tornar as pessoas mais mente aberta a novas ideias. Lembrando que não me refiro ao humor do filme em geral, mas a casos específicos. Enfim.

Uma das coisas que mais incomodou no filme foi a quantidade de xingamentos. Existe uma necessidade fútil de se provar adulto ao inserir palavrões a todo momento, mesmo que fique forçado. Tudo bem que muitos xingam normalmente durante o dia, mas o que a animação faz é exagerar nesse contexto, estragando a naturalidade dos diálogos.

Em meio a cenas ora divertidas ora vergonhosas, toda a tragédia das comidas levam a um desfecho inacreditável, o auge de toda a viagem, em parte surpreendente, em parte repudiante. São minutos insanos com grandes reviravoltas de explodir o cérebro a cada cena, momentos marcantes que ficarão na mente daqueles que presenciaram. Em contrapartida, ao fim toda a mensagem da trama (não adianta fingir que não tem) se resume a "faça o que eu falo, mas não faça o que eu faço, a não ser que queira fazer, até porque você pode, mas não que seja o correto, embora não seja errado, apenas se você considerar errado com base na sociedade, aí sim é muito errado".

Criatividade a mil, premissa interessante, clímax inesquecível, cenas bastante divertidas e certo humor crítico dividem espaço com cenas completamente desnecessárias (incluindo aí alguns personagens) e humor sofrido numa comédia besteirol mais pesada que qualquer filme do gênero. Festa da Salsicha pode não ser uma obra-prima, mas criou um universo rico que pode ser reaproveitado futuramente.

Sobre Mim

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Ninguém importante. Formado em jornalismo. Ex-colunista de cinema, quadrinhos e k-pop por aí.